Lancei esta questão nas minhas redes sociais para tentar avaliar a perceção do adepto comum em relação aos erros de arbitragem.
Confesso que algumas das respostas foram interessantes. Várias pessoas referiram que os árbitros erram por incompetência, má preparação técnica e/ou física, falta de profissionalismo ou desatenção. Curiosamente, foram poucas as que apontaram a desonestidade como motivo principal. Ainda houve espaço para ideias mais rebuscadas, como "para fazerem apostas", por "simpatia clubística" ou "sentimento de vingança".
Esta recolha informal de sensibilidades (não teve peso nem estrutura para contar como sondagem) não deixa de transmitir uma ideia sobre o que pensa quem acompanha o futebol com alguma atenção.
De facto, os árbitros erram. E não vale a pena aqui repisar o velhinho "errare humanum est", porque isso valida más decisões, isentando-as do pensamento crítico que exigem.
Quanto à questão em si, tem várias respostas. Mais do que aquelas que o caro leitor possa deduzir.
Os árbitros erram porque a função é muito difícil e exige tomada de decisão a toda a hora. Há trabalhos e trabalhos e neste, acerto e erro andam de mãos dadas. São duzentas a trezentas decisões por jogo, muitas delas em circunstâncias de análise muito complexas.
Os árbitros erram porque estão sujeitos a forte pressão interna (a classificação no final da época e respetiva progressão de carreira, num ambiente extremamente competitivo) e externa (o escrutínio apertado da imprensa, a visibilidade pública da maioria das decisões e a gestão da vida pessoal e familiar em fases de maior exposição).
Os árbitros erram por incompetência pontual, desconcentração ou negligência, sendo estes os fatores que requerem mais atenção. A arbitragem exige um conjunto de qualidades técnicas e pessoais que, por questões de personalidade ou de formação, nem todos têm. Há quem domine totalmente as leis de jogo e tenha dificuldades em aplicá-las na prática; há quem estude um pouco menos mas seja craque na gestão prática dos jogos. Há também quem tenha mais (ou menos) capacidade de concentração, de compromisso e resiliência. O fator humano está sempre presente no processo de decisão, sendo claro que um dia menos bom pode redundar em maior intolerância ou irritabilidade, ao passo que uma fase boa da vida pode dar mais serenidade para o bom exercício da função.
Os árbitros erram porque nem sempre têm a sensibilidade e inteligência emocional que o lance exige. Há situações em que o apito deve ser substituído pela sensatez, outras pela firmeza; há lances que pressupõem diálogo, outros autoridade. E é nessa difícil calibragem, nessa capacidade de entender o momento, a jogada, o jogador e o jogo, que mora a diferença entre o bom e o mau decisor. Arbitrar é uma arte bem maior do que apitar.
Haverá muitos outros fatores a determinar a existência de erros - a vídeo tecnologia veio demonstrar que nem todos têm capacidade para analisar imagens -, mas a boa notícia é que quase todos podem ser corrigidos com o trabalho certo, da forma adequada.
Há um casamento perfeito que deve continuar a ser feito na preparação dos homens e das mulheres do apito, que é o que alia insistência e rigor dos treinos técnicos/físicos ao cuidado da saúde emocional e psicológica de cada um deles.
Para errarem menos (e esqueçamos a inexistência de erros, impossível de alcançar no futebol), os árbitros precisam de se sentir protegidos e livres, de forma a atuarem com a tranquilidade e clareza de espírito que essa segurança fornece.
Como diria o brilhante Manuel Sérgio: "Não há jogos, há homens que jogam."
E não há árbitros. Há pessoas que arbitram.
Roma e Pavia não se fizeram num dia, mas as coisas podem gradualmente melhorar, assim o trabalho seja feito com rigor, seriedade e paixão.