No passado dia 9 de Abril, Dallas viveu uma das noites mais emocionantes da história da NBA. A partida do talentoso base Luka Doncic foi uma verdadeira facada no coração dos adeptos dos Dallas Mavericks, e o seu regresso era algo pelo que todos ansiavam.

A cidade demonstrou que o seu amor por Doncic será eterno, e devo dizer que foi uma bela manifestação de amor e afeto por alguém que chegou ainda sendo um adolescente (Doncic foi eleito número 3 do Draft da NBA em 2018) e que se tornou um homem aos olhos de todos aqueles que passaram a idolatrá-lo.

Os adeptos do basquetebol sabem ser gratos e reconhecer todo o esforço e contributo dos seus jogadores, e a presença de Luka Doncic tornou novamente relevante a equipa de Dallas e uma franquia capaz de lutar pelos títulos. E contra fatos, não há argumentos.

Pouco depois de ter chegado a Dallas, sendo selecionado como número 3 no Draft da NBA, Doncic foi rapidamente visto e posteriormente adoptado como o sucessor do alemão Dirk Nowitzki, maior ídolo do quadro texano e um dos melhores jogadores europeus de todos os tempos. Com a chegada de Doncic, esse vazio deixado pelo fim da carreira de Nowitzki, foi gradualmente sendo superado pelo carisma e talento ímpares do base esloveno.

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Quando Nico Harrison (diretor geral dos Dallas Mavericks) considerou que um dos melhores jogadores da NBA já não era a solução para trazer um novo título da NBA para a franquia de Dallas, a incredulidade e a revolta dos adeptos dos Mavericks foram maiúsculas e absolutamente consensuais.

Sob a batuta do base esloveno, os Dallas Mavericks chegaram à final da NBA na época transacta, o que ainda torna mais inexplicável a decisão da administração.

A equipa texana acabaria por perder essa final contra os Boston Celtics, mas a chegada à final foi conseguida fruto de uns números impressionantes de Doncic (não deixando de destacar o fantástico desempenho de Kyrie Irving) naqueles play-off. Uma média de 29 pontos, 9 ressaltos e 8 assistências (!) por parte de Luka. Números claramente ao nível de um dos melhores jogadores do mundo da atualidade.

Nico Harrison negou-lhe o maior contrato da história da NBA (um super max que iria fazer com que Doncic fosse auferir mais de 350 milhões de dólares durante 5 anos), que Luka tinha feito por merecer com as suas épocas de grande nível ao serviço da equipa de Dallas.

E chegou ao ponto de alimentar publicamente a narrativa de Doncic ser um jogador problemático, preguiçoso e com maus hábitos fora do campo. O que é certo é que ainda não se ouviu um único comentário negativo (seja de um colega ou de um adversário) sobre Doncic e o seu comportamento tanto dentro como fora do campo.

Com essa decisão ridícula, Nico Harrison (um dos homens de grande confiança durante a carreira do malogrado Kobe Bryant) passou a ser a pessoa mais odiada da cidade de Dallas.

Estou absolutamente certo de que a generalidade dos trabalhadores dos Dallas Mavericks e diria até que grande parte dos elementos da sua direção, foram contrários a esta decisão sem fundamento absolutamente nenhum de trocarem Luka Doncic e permitirem que fosse para uma das equipas mais odiadas da NBA: os Los Angeles Lakers.

Doncic é de longe um dos melhores jogadores da atualidade, um atleta com um carisma impressionante e é um dos melhores jogadores ofensivos de todos os tempos. Decidir abdicar desse talento e trocá-lo por Anthony Davis (que é um grande jogador) que tem uma grande propensão a lesões e que já tem 32 anos, é algo que os adeptos dos Mavericks jamais vão perdoar a Nico Harrison.

E os gritos de “Fire Nico” entoados por todos os adeptos presentes na American Airlines Center de Dallas, foram sintomáticos de toda a insatisfação e revolta dos adeptos dos Mavericks perante uma decisão absolutamente inexplicável e absurda por parte do seu diretor geral.

A reação de Mark Cuban (ex-dono dos Dallas Mavericks e o maior responsável por Luka ter ido parar a Dallas) a esses cânticos de “Fire Nico”, fala por si só. Olhos em baixo, abanando a cabeça, seguro de uma decisão trágica que certamente ele teria evitado, se continuasse a presidir a equipa.

Para termos uma noção do impacto de Doncic, a sua média de pontos nos play-off é apenas inferior a um tal de Michael Jordan, por muitos considerado (e por mim também) o melhor jogador de todos os tempos.

Foi esse nível de qualidade e de talento de que Nico Harrison decidiu prescindir porque considerava que o nível de compromisso defensivo de Luka era insuficiente para que os Mavericks fossem campeões novamente. O nível de impaciência de uma equipa que tem apenas um título (!) da NBA na sua história.

Claro que as defesas ganham campeonatos, mas sem eficiência e agressividade ofensiva, de nada vale ter um grande jogo defensivo.

A equipa texana teve um gesto precioso (que muitos podem considerar hipócrita), estampando t-shirts que foram posteriormente colocadas em todas as cadeiras do seu pavilhão com a expressão eslovena “Hvala za vse” que significa “Obrigado por tudo”.

Antes do jogo começar, a equipa dos Dallas Mavericks colocou nos ecrãs gigantes um vídeo de tributo ao base esloveno, que não conteve a emoção e acabou com o rosto lavado em lágrimas.

A receção a Doncic foi dos momentos mais bonitos do desporto de que me recordo. Os fãs dos Dallas Mavericks receberam o seu grande ídolo com uma ovação estrondosa e apoteótica.

Eu devo confessar-vos algo, caros leitores. Não apenas por ser um fã incondicional do jogo de Doncic desde os seus tempos na Europa ao serviço do Real Madrid (onde já era titular apenas com 15 anos de idade), mas eu próprio não consegui ficar indiferente às lágrimas de um jogador que foi literalmente desprezado e ostracizado por membros da direção de uma equipa a quem deu tudo de si e cujo contributo foi fundamental para conduzir a equipa de Dallas Mavericks à final da NBA na época transacta.

O desporto também tem o condão de nos emocionar, e é também isso que o diferencia dos demais setores da sociedade.

Durante o jogo, Doncic demonstrou que essa troca foi mesmo a pior de todos os tempos da história da NBA. Doncic tem 26 anos, um rendimento desportivo impressionante e é amado incondicionalmente pelos adeptos dos Dallas Mavericks, que fizeram questão de o demonstrar durante todo o jogo.

Ainda de lágrimas nos olhos, Doncic começou o jogo decidido a demonstrar que foi um erro gritante e uma falta de consideração enormes o que fizeram com ele. Acabou a primeira parte com 31 pontos, 3 ressaltos, 3 assistências e 3 roubos de bola. A cara de Nico Harrison era um poema.

Até aos minutos finais do jogo, foi um enorme LeBron James (que ainda apresenta um rendimento excepcional apesar dos seus 40 anos) a segurar a equipa dos Lakers, sendo que Doncic voltou a aparecer nos minutos finais do jogo para contribuir decisivamente para uma vitória tão importante para a sua equipa.

Durante esse jogo, viveu-se algo inédito na NBA. Os adeptos dos Dallas Mavericks aplaudiam toda e qualquer ação da equipa texana, não apenas de Luka Doncic, como se quisessem que a sua equipa perdesse, e muito provavelmente era mesmo esse o sentimento geral dos fãs presentes no pavilhão.

Doncic acabou o jogo com 45 pontos, 8 ressaltos, 6 assistências e 4 roubos de bola, tornando-se o segundo jogador da história a marcar 45 pontos a duas equipas diferentes na mesma temporada, a par de Wilt Chamberlain.

Há algo mais que quero destacar. O comportamento absolutamente exemplar de Luka Doncic durante todo este processo. Nem uma palavra negativa sobre Nico Harrison, sobre a equipa e sobre a cidade de Dallas, por quem tem um amor tão profundo.

E apesar de ter jogado em modo vingança, e de ser um jogador bastante temperamental, preferiu estar absorto naquela imensa bolha de amor, e não fazer um único gesto provocatório, nem uma má palavra sobre nada, dedicou-se apenas a jogar basquetebol.

E quando Luka se dedica apenas a isso, é sem dúvida alguma um dos melhores executantes do mundo.

No fim do jogo, Doncic disse que depois de ver o vídeo de tributo anteriormente mencionado, pensou que não iria conseguir jogar, porque receava que a emoção se fosse apoderar de si mesmo, e que não iria conseguir exibir-se ao nível desejado, num jogo que era de extrema importância para a sua nova equipa: os Los Angeles Lakers.

Mas Luka fez um jogo incrível, sabedor de que a sua equipa necessitava dessa vitória para garantir o seu lugar nos play-off, evitando jogar o tão perigoso play–in (novo formato de eliminação da NBA, onde praticamente se joga uma época num jogo).

Com essa vitória categórica (112-97), Doncic foi fundamental para ajudar os Lakers a cimentar o terceiro lugar na tão disputada Conferência Oeste, e dessa forma ter um percurso menos complicado para poder chegar à final da Conferência e, consequentemente, estarem mais próximos de voltarem a ser campeões da NBA.

JJ Redick, o treinador da equipa dos Los Angeles Lakers, enalteceu a exibição monumental de Doncic nesse jogo, proferindo as seguintes declarações: “A sua capacidade de se exibir ao melhor nível, depois das luzes se acenderem, ainda com os olhos cheios de lágrimas quando entramos no campo para começar o jogo. (…) Conseguir estar resolvido emocionalmente e depois ter este desempenho, é algo sobre-humano.”

Na entrevista rápida após o fim do jogo e quando questionado sobre o que foi mais especial neste seu regresso a Dallas, Doncic disse o seguinte: “Hoje dormi na minha cama”. E disse-o de voz embargada e com uma emoção palpável.

Como disse e bem Trae Young (base dos Atlanta Hawks e seu colega do Draft de 2018), “Ele nunca iria sair”. E terem duvidado do compromisso e dedicação de Luka Doncic, é um ultraje.

Sim, as estrelas da NBA têm contratos milionários e uma vida privilegiada, mas antes de serem grandes jogadores de basquetebol, são seres-humanos e foi muito bom para todos os amantes deste desporto (nomeadamente a agressiva imprensa que cobre a NBA nos Estados Unidos), poderem presenciar e vivenciar este momento, para que entendam que alguns jogadores criam laços verdadeiros e genuínos com os adeptos da sua equipa e com a cidade que os acolheu.

Este testemunho do talentoso base norte-americano foi apenas um de vários que se pronunciaram a respeito deste momento tão tocante de Luka Doncic, que demonstrou uma grande vulnerabilidade, que se deixou levar pelas emoções, e onde ficou bem evidente que ele jamais deixaria a equipa por sua livre e espontânea vontade.

O tempo dirá quem ganhará esta troca, mas estou certo de que Doncic se tornou um verdadeiro Laker depois deste jogo e vai estar ainda mais focado na missão de demonstrar a todos os seus detratores que ele já é um dos melhores europeus de todos os tempos a jogar na NBA, e que se mantiver o mesmo nível durante muitos anos, irá entrar certamente para o Hall of Fame (que destaca os melhores jogadores de sempre da NBA).

“É tempo de seguir em frente”, disse Luka no fim do jogo. Mas estou seguro de que independentemente de tudo o que venha a conquistar ao serviço dos Lakers, Dallas será sempre a sua casa.