
25 de julho de 1992, Barcelona, Estádio Olímpico. As mais altas figuras mundiais estão ali presentes... Rei Juan Carlos I, Felipe González, Nelson Mandela, François Mitterand, Helmut Kohl e Fidel Castro destacam-se nas principais tribunas... Ali perto, Juan Antonio Samaranch, presidente do Comité Olímpico Internacional (COI).
Lá em baixo, no relvado, um espetáculo sem igual. Os tenores espanhóis Josep Carreras e Placido Domingo levam o público aos píncaros. A emoção crescente da cerimónia de abertura dos Jogos Olímpicos ainda não tem a luz da noite, mas muito antes, como diz um dia um radialista da nossa praça, 'Era o delírio atrás das bancadas'.
Tó Neves, hoquista de Portugal na altura, faz parte da seleção que participa nas olimpíadas, na condição de desporto de exibição. Em conversa com o zerozero, diz sem reservas o que lhe lavra a alma: «A cerimónia de abertura dos Jogos Olímpicos de 1992 foi das melhores experiências que tive enquanto atleta de hóquei patins.»

A justificação para tal cenário é óbvia: o hóquei em patins não está inserido na Aldeia Olímpica, mas baseado em Vic, a cerca de 50 quilómetros de Barcelona. E há um trajeto feito fora do horário. «Fomos para a cerimónia bastante cedo e o cordão de segurança era imenso. Ninguém nos queria deixar passar. No entanto, o António Livramento conseguiu convencê-los. É certo que estávamos identificados, mas ele fez mil e uma coisas para chegarmos à zona do anel olímpico», explica Tó Neves.
A primeira aventura é concluída com sucesso, mas há mais: «Quando chegámos ao Palau Sant Jordi havia o espaço da delegação portuguesa, mas estava vazio. Tínhamos chegado mais de uma hora antes. Víamos as outras comitivas a chegar e Portugal nunca mais chegava», recorda Tó Neves.
Com tempo, há espaço para dar de caras com alguns ilustres: «Andámos pelos corredores do Palau de Saint Jordi e cruzámo-nos com a Dream Team do basquetebol americano. Foi um momento incrível. Muito simpáticos, disponíveis para fotografias, apesar de estarem em circulação para outra zona...»
A seleção nacional é, por esses dias, a Dream Team da modalidade: campeões do Mundo, campeões da Europa... Portugal limpa tudo, mas naquele ano há outra Dream Team mais importante, a do basquetebol americano. O COI permite a atletas profissionais participar nos Jogos pela primeira vez e o EUA apresentam a artilharia pesada para o torneio olímpico de basquetebol: Michael Jordan, Scottie Pippen, Magic Johnson, Larry Bird, Charles Barkley, Karl Malone, David Robinson, Patrick Ewing, John Stockton... Muitos anéis, para os apenas cinco olímpicos...

«Foi uma noite inolvidável»
«O que mais me marcou foi a entrada no Estádio Olímpico e a volta olímpica... Foi de arrepiar, nunca senti isso num jogo... Foi inolvidável.»
O brilhozinho no olhar de Tó Neves não mente. A imponência do Jogos Olímpicos deixa marcas que os mais de 30 anos de distância não deixam fugir: «Depois, já depois de estarmos no meio das outras comitivas, víamos de tudo... Povos vestidos de indígenas... Encontrámos a Arantxa Sánchez Vicario, do ténis. Foi uma experiência espetacular.»
Tó Neves recorda a preparação para os Jogos Olímpicos, que conta com o encontro com o velocista canadiano Ben Johnson, ainda em Lisboa, e o tenista Jim Courier no aeroporto de Barcelona. Sobre a cerimónia sabia-se de tudo, menos de como ia ser acendida a pira olímpica: «Acho que toda a gente ficou a torcer pelo homem, para ele conseguir acertar com a seta na pira olímpica. Ia ser uma vergonha, se falhasse. O espetáculo musicial foi tremendo, foi mesmo brutal.»

A desilusão de um amor de verão
Tó Neves torna-se lenda na modalidade. Em 1992 já tem todos os títulos principais e fala com alguma tristeza sobre o hóquei em patins nos Jogos Olímpicos de 1992: «Talvez tenha sido, no mesmo evento, o melhor que me aconteceu e o pior.»
O goleador recorda aqueles 15 dias do verão catalão: «Não termos ganho uma medalha, quando tivemos hipótese de mandar a Argentina embora e colocar os Estados Unidos da América a disputar uma medalha, e não o fizemos pela verdade desportiva... Bastava não termos ganho e a Argentina, que depois foi campeã olímpica, era eliminada. Os Estados Unidos da América teriam ido disputar uma medalha olímpica. Se isso tivesse acontecido, quem sabe a modalidade teria continuado a ser olímpica.»
Tó Neves não tem dúvidas em classificar aquela altura como a era dourada da modalidade, mas as sensações que lhe assaltam a alma ainda não o fazem voltar a entrar no Estádio Olímpico: «Nunca mais entrei no estádio, só passei à volta. Iam ser sensações muito estranhas, pois saímos dos Jogos Olímpicos a sentir que a modalidade fez tudo bem para continuar a ser olímpica. Se eu quiser escolher os três melhores jogos que vi, ou participei, a final olímpica está num deles. Teve golos, reviravoltas, com prolongamento, uma arbitragem exemplar. É muito difícil engolir essa realidade, da modalidade não ser olímpica, depois daquele espetáculo.»
