Ainda não havia subido ao relvado de Old Trafford e o burburinho do Teatro dos Sonhos já se tinha alterado. A expectativa começava a dar à manivela nas bocas dos expectantes observadores do Manchester United- Bodø/Glimt. O jogador que ia entrar não era um qualquer. Era um lad, um menino da casa que, como tal, goza de tolerância máxima quanto ao julgamento popular das suas imperfeições. Meias que pareciam necessitar de suspensórios para se manterem tão acima do joelho e figura esguia: lá ia o galgo Marcus Rashford pela enésima vez tentar reencontrar-se com o seu futebol.

Não tardou a esgueirar-se para uma posição de onde marcar era o mais certo estivesse o avançado na forma que o levou a chegar aos 30 golos em 2022/23. Como não é o caso, o desenxabido remate foi soprado para o lado. “Ele tem que ser o Marcus.” Era simples a dica do gestor de recursos humanos Ruben Amorim para que Rashford voltasse à melhor versão, mas o inglês não terá visto nela a forma de resolver os problemas.

“Acho que estou pronto para um novo desafio e para dar os próximos passos”, disse frontalmente o jogador de 27 anos ao jornalista Henry Winter. A intenção foi manifestada depois de Ruben Amorim ter abdicado de Rashford e Garnacho no jogo contra o Manchester City, deixando o aviso: “Presto atenção a tudo, desde a forma como comem, à forma como se vestem para ir para o jogo. Depois, avalio e decido.”

Justin Setterfield

No mesmo dia em que se mostrou disposto a sair do Manchester United, Marcus Rashford regressou à sua antiga escola primária para dar 420 presentes e comida a crianças. Também por isto é alguém que os adeptos dos red devils têm dificuldade em ver partir. Rashford jogou toda a vida no clube. Quando era criança, apanhava quatro autocarros para ir treinar, porque no pobre contexto familiar não existia forma de sustentar um carro. Mesmo assim, nunca foi desarmado pelas dificuldades e chegou à equipa principal.

Além do rendimento desleixado, a vida fora do campo também tem andado num reboliço. Em janeiro, o Manchester United aplicou uma multa de £650.000 ao jogador por este ter passado uma noite em Belfast a beber tequila durante 12 horas. Mais tarde, seria apanhado a conduzir em excesso de velocidade, situação à qual se seguiu um efetivo acidente.

Os sucessivos episódios colocaram em causa o profissionalismo aos olhos da opinião pública e não demoraram a ser envolvidos na relação causa-efeito com a falta de golos. “Não sou uma pessoa perfeita”, confessou no The Players' Tribune depois de ser revelado o consumo de rios de álcool na Irlanda do Norte. “Quando se questiona o meu compromisso com o Manchester United, é aí que tenho que falar. É como se alguém questionasse toda a minha identidade e tudo o que defendo como homem.”

Em Inglaterra, a ação de Ruben Amorim foi percecionada como um estabelecimento dos padrões mínimos de comportamento. Ainda assim, mesmo com o posicionamento claro de Rashford, que pode levar à sua saída no mercado de janeiro, o técnico português continua a querer “tirar o melhor” dele. “Somos melhores com o Marcus Rashford, é simples. Vamos tentar diferentes coisas para que ele atinja o nível que mostrou no passado.”

O internacional inglês – que falhou o Euro 2024, após presença consecutiva em quatro grandes competições – vai angariando interessados para o resgatarem de onde assumiu não querer mais estar. Os votos de eterno compromisso com o Manchester United estão presos por um fio.