Será que os dez pontos que o Benfica soma (e o Sporting, já agora) chegam para aceder ao playoff da Champions? Muito provavelmente, sim. Dois é que não vão chegar, e foi com esse ‘embrulho’ que o Bolonha saiu da Luz, onde só a vitória lhe interessava, tornando inexplicável a ‘cera’ que fez, com perdas de tempo do guarda-redes e simulações de lesões (toleradas por um árbitro sem personalidade), como se o empate fosse um objetivo importante.

Diga-se, desde já, que o Benfica fez mais do que o suficiente para ganhar, apesar da primeira parte timorata que assinou. Skorupski, internacional polaco (jogou na última vitória de Portugal em Varsóvia), esteve numa noite em que até o vento parou com as mãos, e irá engrandecer o seu álbum de memórias com uma defesa extraordinária a um remate à meia volta de Di María (41), e depois, aos 67 minutos, realizou uma parada impossível a remate de Pavlidis, quando o estádio da Luz já gritava golo. Além destes momentos, ainda se mostrou seguro no jogo aéreo (que salvou o Benfica no Mónaco) e teve outras defesas de que pode orgulhar-se. Foi ele o principal obstáculo entre o Benfica e os três pontos em disputa.

DEMORAR A ACORDAR

Com o seu figurino habitual, um 4x2x3x1 que muitas vezes passa a 4x3x3, e no momento de pressão alta a 4x4x2, o Benfica até começou o jogo em grande estilo, pois logo aos dois minutos Pavlidis meteu a bola no fundo das redes transalpinas, num lance que pareceu legal até as imagens televisivas mostrarem que o grego estava um pé fora-de-jogo. A partir desse minuto, e especificamente a partir de um passe suicida de Florentino para a zona central, que gerou uma situação perigosa (5), o Bolonha cresceu em confiança e o Benfica inexplicavelmente retraiu-se. A equipa de Bruno Lage passou a marcar à zona, muitas vezes recolhida no seu primeiro terço, deixando ao Bolonha espaço e tempo para mandar na partida, estabelecer ritmos e chegar ao intervalo com uma vantagem na posse de bola de 56 a 44 por cento. Contra uma equipa de Itália e dirigida por um treinador de nome Italiano, seria de esperar que o Bolonha não jogasse à italiana, cínico, a meter gelo no jogo, à espreita de uma nesga para levar o seu jogo de paciência a bom porto? Foi o pior período do Benfica, que em vez de jogar viu jogar, sem que houvesse quem desse um grito e acordasse as hostes, que só animaram com o pontapé-maravilha de Di María. Mas expliquemos um pouco mais em detalhe a razão de tanta posse de bola do Bolonha: a jogar em 4x2x3x1, os transalpinos juntaram muitas vezes o duplo pivot com o trio que atuava nas costas do ponta de lança, ficando com cinco elementos no meio-campo, onde o Benfica tinha apenas três (ou quatro, quando Arkturkoglu baixava). Daí que tenha tido períodos tecnicamente evoluídos, mas sem pressão encarnadaque obrigasse ao erro.

SORTE DO JOGO DE COSTAS

Para dar ideia da forma como as coisas se alteraram no segundo tempo, usemos os números. Nos derradeiros 45 minutos, o Benfica transformou a desvantagem na posse de bola de 44/56 numa vantagem de 52/48. Porquê? Apenas porque perdeu o medo, foi agressivo e virou o tabuleiro do conforto onde os italianos estavam a jogar. Bruno Lage só operou mudanças aos 72 minutos (Pavlidis e Arkturkoglu por Amdouni e Beste), reservando a última (Kokçu por Arthur Cabral) para os 80. É verdade que com sangue fresco encarnado os italianos passaram a sofrer muito mais, fosse pela tripla Bah, Aurnes, Di María, na direita, ou por Carreras e Beste na esquerda. Mas ainda antes das substituições já havia outro Benfica, e isso nada teve a ver com a tática ou com os jogadores (tudo igual), mas com a dinâmica e a intensidade, afinal duas condições que fazem toda a diferença no futebol moderno.

Acabou por ser quase cruel ver como uma equipa estava a ser tão melhor que a outra e a bola teimava em não querer entrar, talvez com os Deuses do futebol a castigarem o Benfica pelo tempo que desperdiçou numa primeira parte amorfa. Deste jogo, onde Di María foi o virtuoso do costume  e Tomás Araújo deu à defesa a profundidade que precisava, Lage deverá tirar algumas ilações e questionar-se em relação a questões coletivas e individuais: do ponto de vista coletivo, a relação com o adversário a meio-campo carecerá de estudo aprofundado; no campo individual, apesar de toda a entrega de Pavlidis e da importância que tem no processo defensivo, talvez seja tempo de dar mais minutos a Arthur Cabral, capaz de maior letalidade na hora da verdade.

Em resumo, a Luz saiu de bem com a equipa, que atingiu momentos de galvanização na metade complementar. Seguem-se Barcelona e Juventus, já em 2025, mas o Benfica continua vivo na Champions…