A sintonia entre o rumo e as ações de um partido oscila conforme a capacidade das lideranças em conciliar os fundamentos da ideologia com os desafios da atualidade. Contudo, os princípios fundamentais de um partido devem ser uma âncora identitária para os militantes - uma âncora que deixou de existir no PSD.

Ao final de um percurso, devemos sempre recordar o motivo pelo qual começámos. Filiei-me há quase 20 anos no PSD(Madeira) para tentar democratizar a estrutura, mesmo que de forma modesta. Foi na JSD que concorri contra um elemento jardinista, apesar de saber que todas as fichas estavam do outro lado. Apoiei o processo de renovação interna que culminou com a vitória de Miguel Albuquerque. Tive o privilégio de servir como deputada à Assembleia da República entre 2015 e 2019 - sempre fiel aos princípios fundamentais social-democratas, autonomistas e ao meu imperativo moral. Em 2024 apresentei uma moção ao congresso do PSD-Madeira para excluir a possibilidade do PSD de encetar colaborações com a extrema-direita. É por todos esses mesmos motivos que hoje me é impossível continuar num partido que se descaracteriza da sua matriz social-democrata.

Torna-se impossível continuar a pertencer a um partido que, para sobreviver à dura aritmética parlamentar, está disposto a pactuar com a extrema-direita, cavalgando populismos e confundindo política de imigração com a lei da nacionalidade. Um partido que, em vez de sanar as feridas entre diferentes grupos sociais - originadas nos duros anos da Troika - incita essas divergências, ao querer reabrir a caixa de Pandora da lei da greve. Um partido cuja memória de Sá Carneiro é recurso meramente decorativo, para citações em discursos, mas sem intenção de implementá-la.

É impossível permanecer militante de um partido que baseou toda uma campanha para as eleições legislativas na fabricação de uma dicotomia entre fazedores versus bloqueadores, questionando as mais básicas exigências de maior transparência no exercício de cargos públicos. Recusar documentação sob o pretexto de “deixar os políticos trabalhar”, vilipendiar atos eleitorais e o normal funcionamento da democracia - isso é um filme que já se assistiu noutras latitudes, mas não se esperava de uma estrutura nacional.

É impossível fechar os olhos às ausências de pluralismo, de respeito democrático e de tolerância especialmente numa região de Portugal: a Madeira. Em 2015, o PSD prometeu reformar o sistema político regional, criar diálogo e abertura democrática depois do longo período de “pensamento único” do anterior líder regional. No entanto, passados dez anos, constatamos uma confrangedora persistência da intolerância: desde a forma como foram saneados apoiantes de listas concorrentes internas, até o mais recente episódio de profundo e abjeto desrespeito pela casa da Democracia Regional por parte de um governante do governo regional, oficialmente tolerado e justificado.

Quando a crítica e o debate plural - conquistas de Abril - se tornam “delitos de opinião”, quem sai prejudicado é o desenvolvimento democrático de uma região, de um país, de um partido. Quando nem a nível nacional existe uma acendalha de esperança que retire o PSD do monocromatismo de pensamento, é preciso agir em conformidade com a própria consciência.

Assim, entre os vínculos a princípios humanistas e democráticos, e o vínculo partidário ao PSD, escolho, naturalmente, os primeiros.