
Às 17h00 era a hora prevista para, a partir da Sala de Atos Públicos do Tribunal Constitucional (TC), a leitura pública da decisão relativa ao pedido de fiscalização preventiva, requerida pelo Presidente da República no passado dia 24 de junho. Mas só mais de uma hora depois, se soube a decisão dos juízes do Ratton.
A decisão, aprovada “por maioria”, foi anunciada pela juíza conselheira e relatora do acórdão, Joana Fernandes Costa. Em causa estavam quatro normas constantes do Decreto n.º 6/XVII da Assembleia da República, que altera a Lei n.º 23/2007, e apenas uma escapou ‘ao chumbo’ do TC.
Quanto ao “novo n.º 1 do artigo 98.º, ao não incluir o cônjuge ou equiparado, pode impor a desagregação da família nuclear do cidadão estrangeiro titular de autorização de residência válida e é, por isso, suscetível de conduzir à separação dos membros da família constituída desse cidadão estrangeiro, que resida validamente em Portugal há menos de dois anos, o que se traduz numa violação dos direitos consagrados nos n.ºs 1 e 6 do artigo 36.º da Constituição”.
No mesmo sentido, sobre o novo “n.º 3 do artigo 98.º”, considerou o coletivo de juízes do TC que “a imposição de um prazo absoluto de dois anos até à apresentação do pedido de reagrupamento familiar com todos os membros da família maiores de idade que se encontrem fora do território nacional é incompatível com a proteção constitucionalmente devida à família, em particular à convivência dos cônjuges ou equiparados entre si e à de qualquer deles com os respetivos filhos menores de idade".
"Com respeito às condições de exercício do direito ao reagrupamento familiar, o Tribunal entende que os pressupostos previstos nas alíneas a) e b) do n.º 1 do artigo 101.º não são inconstitucionais, mas a previsão de medidas de integração constante do n.º 3 do artigo 101.º viola o princípio da reserva de lei (alínea b) do n.º 1 do artigo 165.º da Constituição).
Já quanto “às normas relativas ao prazo de decisão do pedido de reagrupamento familiar, o Tribunal considera que o n.º 1 do artigo 105.º, ao somar um prazo de decisão de nove meses, prorrogável até dezoito meses, ao período de dois anos de espera previsto no n.º 3 do artigo 98.º, não é compatível com os deveres de proteção da família a que o Estado se encontra vinculado” na Constituição.
“Em matéria de tutela jurisdicional - recurso à ação especial de intimação para proteção de direitos, liberdades e garantias - o Tribunal entende que a norma do n.º 2 do artigo 87.º-B é inconstitucional, por violação dos artigos 20.º, n.º 1, 18.º, n.º 2, e 268.º, n.º 4, da Constituição, ao passo que o n.º 3 do artigo 87.º-B não enferma de inconstitucionalidade”.
Porém, salienta o acórdão, “a diferenciação positiva dos titulares de autorizações de residência concedidas ao abrigo dos artigos 90.º, 90.º-A e 121.º A não se afigura desproporcionada, nem discriminatória”.
O diploma será agora devolvido ao Parlamento para que sejam expurgadas as normas que violam a lei fundamental.
Só PSD, Chega e CDS votaram a favor
Recorde-se que o decreto foi aprovado em 16 de julho na Assembleia da República, com os votos favoráveis de PSD, Chega e CDS-PP, abstenção da IL e votos contra de PS, Livre, PCP, BE, PAN e JPP.
O diploma foi criticado por quase todos os partidos, com exceção de PSD, Chega e CDS-PP, com vários a considerarem-no inconstitucional e a criticarem a forma como o processo legislativo decorreu, sem ouvir associações de imigrantes ou constitucionalistas e com a ausência de pareces obrigatórios.
No requerimento enviado por Marcelo Rebelo de Sousa ao TC, o Presidente da República pediu a fiscalização preventiva da constitucionalidade das normas sobre direito ao reagrupamento familiar e condições para o seu exercício, sobre o prazo para apreciação de pedidos pela Agência para a Integração Migrações e Asilo (AIMA) e o direito de recurso.