Nem a seguir a José Sócrates ter sido detido em 2014 — e depois acusado em 2017 — como o primeiro chefe de governo suspeito de corrupção desde o 25 de abril, Portugal esteve tão mal como agora do ponto de vista do que parece ser o nível de corrupção que afeta o país, a crer nos resultados do Índice de Percepção da Corrupção 2024 divulgado esta terça-feira pela Transparência Internacional. Portugal caiu da 34.ª para a 43.ª posição num ‘ranking’ global onde constam 180 países.

Com 57 pontos, menos quatro do que há um ano, Portugal passou a ter a mesma pontuação que o Botsuana e o Ruanda e menos do que a Arábia Saudita e a Costa Rica. A escala de avaliação vai dos 0 aos 100, em que 0 é o mais corrupto possível e 100 é não corrupto.

Na Europa, a pontuação média é de 64 pontos. Embora esteja melhor do que Espanha, Itália e Grécia, Portugal está abaixo do resultado médio europeu, ficando a 10 pontos de França, 18 pontos da Alemanha e a 33 pontos do melhor classificado, a Dinamarca.

Expresso

Para o capítulo português daquela organização internacional, o pior desempenho de Portugal em 2024 deve-se a uma “perceção de abuso de cargos públicos para benefícios privados e por fragilidades nos mecanismos de integridade pública para evitar esse abuso”, agravada por uma “avaliação negativa da eficácia do combate à corrupção e do funcionamento das instituições públicas” e uma “fragilidade na implementação de políticas anticorrupção e na supervisão do setor público, incluindo lacunas na prevenção de conflitos de interesse e na declaração de bens por políticos”.

O índice é construído com base numa combinação de 13 fontes documentais produzidas nos dois anos anteriores por 12 instituições, incluindo o Banco Mundial, a Freedom House, o World Economic Forum e a Fundação Bertelsmann, que por sua vez recolhem dados recorrendo a especialistas e a inquéritos.

À escala global, onde a Venezuela, a Somália e o Sudão do Sul surgem nos piores lugares, Maíra Martini, CEO da Transparência Internacional, chama a atenção para o modo como a corrupção é um fenómeno que põe seriamente em causa o combate às alterações climáticas. “Os governos e as organizações multilaterais devem incorporar medidas anticorrupção nas suas políticas climáticas para salvaguardar o financiamento, restabelecer a confiança e maximizar o impacto dessas medidas.”

A Operação Influencer terá ajudado?

Em Portugal, a degradação da imagem do país, sobretudo quanto à integridade dos titulares de cargos políticos e funcionários públicos, terá sido impulsionada, segundo a Transparência Internacional Portugal, por alguns escândalos relacionados com as “ligações entre políticos e negócios”.

“O pior resultado de sempre deve-se em primeiro lugar a uma componente cumulativa”, explica Margarida Mano, presidente do capítulo nacional da TI. “Portugal tem identificados problemas estruturais que não vêm a ser corrigidos, com impacto e desgaste ao longo do tempo, revelando falta de compromisso político e baixa eficácia nas ações desenvolvidas.”. Além disso, segundo esta dirigente, “existem também circunstâncias conjunturais, como a Operação Influencer, com impacto na percepção da integridade no setor publico, que contribuem para este resultado.” Apesar de ninguém ter sido acusado ainda nesse inquérito-crime, o caso levou o então primeiro-ministro António Costa a demitir-se (e ainda que não sejam conhecidosindícios contra ele).

“Portugal deve encarar os resultados do CPI 2024 como um alerta e uma responsabilidade”, acrescenta Jorge Máximo, vogal da direção. “Um alerta para a urgência de fortalecer a transparência e o combate à corrupção, e uma responsabilidade para garantir a implementação eficaz de medidas que consolidem uma governação mais íntegra e eficiente.”