
Há quatro anos, a descoberta inesperada nas nuvens de Vénus de um gás que na Terra significa vida - a fosfina - foi entusiasmante, mas acabou alvo de controvérsia, com observações subsequentes a não corroborarem a afirmação.
Agora, a mesma equipa por detrás desta descoberta regressou com mais observações, que apresentou a 17 de julho numa reunião da Royal Astronomical Society, no Reino Unido, e que constituem a base de estudos científicos a publicar.
Os dados preliminares, dizem os investigadores, contêm provas ainda mais fortes de que a fosfina está presente nas nuvens de Vénus, o nosso vizinho planetário mais próximo e apelidado "gémeo mau" da Terra, porque é semelhante ao nosso planeta em tamanho, mas as temperaturas à superfície podem derreter chumbo e tem nuvens de ácido sulfúrico corrosivo.
As novas provas provêm de um novo recetor instalado num dos instrumentos utilizados para as observações, o Telescópio James Clerk Maxwell no Havai, que forneceu "muito mais dados em si”, disse Dave Clements, leitor de astrofísica no Imperial College London.
“Fizemos três campanhas de observação e, só numa, obtivemos 140 vezes mais dados do que na observação original. E o que obtivemos até agora indica mais uma vez a presença de fosfina", afirmou na reunião da Royal Astronomical Society.
Mas o estudo feito por outra equipa, de que Dave Clements também faz parte, fez uma descoberta ainda mais notável: a presença de amoníaco nas nuvens de Vénus.
“Isto é indiscutivelmente mais significativo do que a descoberta da fosfina”, garantiu Clements.
Fosfina, um marcador de vida
A fosfina ou fosfamina (PH3), constituída por hidrogénio e fósforo, é um gás incolor, muito tóxico e com um "odor extremamente fedorento", como explicou em 2020 a cientista Clara Sousa Silva à SIC Notícias. A cientista no MIT deu um grande contributo para a investigação de 2020, uma vez que a fosfina é a molécula que tem estudado desde o seu doutoramento e que continuará a estudar.
A fosfina é rara na Terra e é tóxica para os organismos que vivem de oxigénio - como nós seres humanos. Mas para a vida anaeróbica, que vive sem oxigénio, em pântanos e nos intestinos da maioria dos animais, a fosfina não representa problema.
Na Terra, este gás é produzido por estes organismos vivos que prosperam nesses ambientes livres de oxigénio e também é produzido pela indústria.
Um zoom in ao planeta Vénus numa animação feita a partir dos dados obtidos com o telescópio James Clerk Maxwell e do radiotelescópio ALMA.
Futuras missões a Vénus
Vénus não será apenas o "gémeo mau da Terra", mas um mundo em mudança com vulcões, uma atmosfera densa, temperaturas infernais e alguma coisa realmente estranha a acontecer nas suas nuvens. Há muito mais para descobrir sobre este mundo fascinante e, felizmente, tanto a NASAcomo aAgência Espacial Europeia (ESA) planeiam lá voltar em breve.
A NASA anunciou em 2021 duas novas missões de exploração a Vénus, para tentar compreender porque se tornou o "mundo do inferno" enquanto a vizinha Terra se tornou habitável - as missões Davinci+ (Deep Atmosphere Venus Investigation of Noble gases, Chemistry, and Imaging) e Veritas (Venus Emissivity, Radio Science, InSAR, Topography, and Spectroscopy), previstas para descolar "no período de 2028-2030".
No final de 2024 está também previstaa missão privada do Rocket Lab e do MITa Vénus que tem como objetivo procurar material orgânico, possível indicador de vida, na atmosfera do planeta.
A nave Venus Life Finder, equipada com uma sonda construída em parceria com o Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT), partirá a 30 de dezembro para chegar a Vénus uma ano e meio depois. Uma vez lá chegada, a sonda lançará um instrumento nas nuvens venusianas que transmitirá dados à sonda orbital para catalogar moléculas e determinar se alguma delas indica existência de vida.