Perante uma proposta de alteração da lei do trabalho levada a cabo pelo Governo da República, que vai desde os limites à licença de amamentação até ao luto gestacional, ficou a pairar a dúvida sobre se os direitos das mulheres estão a ser ameaçados em Portugal.

O DIÁRIO-Social quis ouvir Joana Martins, coordenadora da delegação regional da Associação Feminista UMAR, que respondeu afirmativamente à nossa questão, sublinhando “que este retrocesso a nível laboral vai ter efeitos muito nocivos ao nível dos diretos das mulheres.”

A defensora dos direitos das mulheres garantiu que “estamos a atravessar um momento delicado, muitas vezes influenciado pelos extremismos políticos que estão a surgir um pouco por todo o mundo. Antes era uma coisa um pouco mais distante de nós, mas agora não é.”

Esses extremismos vão beber a sua força às insatisfações que as pessoas sentem e, com um discurso populista vão manipulando. Defendem misoginia, machismo, a penalização da violência, mas não a sua prevenção, com respeito pela diversidade. Isto tudo vai influenciando a sociedade, porque muitas pessoas estão descrentes da política e acabam por dar força a estas forças partidárias que se dizem diferentes e alternativas, muitas vezes sem perceberem o que defendem e depois acaba por haver graves retrocessos. Joana Martins

A coordenadora da UMAR adiantou ainda que no último ano, durante o trabalho que a associação realiza no âmbito da prevenção primária da violência nas escolas, sentiram que “houve um retrocesso na mentalidade dos jovens e, aqui temos de colocar mais nos rapazes do que nas raparigas.”

A razão, segundo Joana Martins, prende-se com a desinformação a que estão sujeitos, muitas vezes sem acompanhamento ou discernimento para filtrar o que é real ou não.

O que vemos agora nas redes sociais são muitos ‘influencers’ que defendem ideias horrendas no que diz respeito ao papel da mulher. Se não houver uma prevenção primária permanente nas escolas, seja na disciplina de Cidadania ou outras, que vá desconstruindo esta desinformação que vai chegando aos jovens, dificilmente vamos conseguir combater o retrocesso. Temos de actuar mais em colectivo e a longo prazo, não é fazer apenas acções de sensibilização, mas acompanhar os jovens para desconstruir estas questões desde cedo.

A activista fez questão de mencionar ainda a retirada de conteúdos de educação sexual da disciplina de cidadania “como se fosse um bicho papão, mas na verdade estamos é a retirar ferramentas aos jovens e mesmo crianças, para serem conscientes sobre as suas emoções, os seus limites, sobre o consentimento."

Quando levada a comentar sobre se a população em geral entende que esta não é uma luta exclusiva de mulheres, Joana Martins não conseguiu esconder o desânimo, lembrando que o problema começa ainda na palavra feminismo, que não é entendida ainda pela maioria, pois é erradamente difundida como contrária ao machismo, quando na verdade o que defende é a igualdade de direitos e oportunidades para todos os seres humanos e não a superioridade da mulher.

A coordenadora da UMAR abordou ainda o papel das redes sociais no retrocesso da igualdade de género, onde “existem muitos casos de difamação, de ataque e violência verbal. Quando há alguém que vai contra a maré é enxovalhado e quando é mulher ainda é pior”.

As repercussões negativas estendem-se aos mais velhos com casos graves de burlas e manipulação.

“Conheço alguns casos gravíssimos de burla, de tentar seduzir para conseguir dinheiro, utilizando mesmo vídeos falsos, ‘deep fakes’ e manipulação. Aproveitam a solidão de muitas mulheres mais velhas, mas também de homens, que acabaram se endividando e tiveram desgostos amorosos, porque acreditavam que estavam a lidar com uma pessoa real. Isto é gravíssimo e temos de fazer alguma coisa. Se nós empoderarmos as pessoas, se tiverem uma auto-estima mais elevada e algo que puxe por elas vão ser mais resilientes a estes ataques na internet”, frisou Joana Martins.

Não perca a entrevista na íntegra, dividida em duas partes, disponível no canal do DIÁRIO, no YouTube.