A coordenadora do Bloco de Esquerda (BE) e o secretário-geral da CDU não esconderam que é mais o que os une do que aquilo que os afasta, até nos recados a Pedro Nuno Santos - um dos alvos deste frente-a-frente na RTP3 entre ‘não-adversários’. Recusando entrar na "matemática” do pós-eleições, Mariana Mortágua repetiu que está disponível para conversar, já Paulo Raimundo diz que são bem-vindos todos aqueles que queiram “romper com o caminho atual”.

"O entendimento depende das políticas. O BE apresenta prioridades às eleições e cá estaremos para conversar com o PS e todos os deputados que queiram um teto às rendas, uma política fiscal justa e respeitar quem trabalha por turnos", elencou a bloquista, trazendo o elefante para a sala: a pergunta que devemos fazer é se PS com PSD ou se PSD com PS vão fazer aquilo juntos que não fizeram separados?”

Para Paulo Raimundo, o que o país precisa é de “romper com o caminho atual, da continuidade da política que está a ser seguida" e que, avisou, não é apenas do último Governo PSD/CDS-PP.

“Todos aqueles que queiram vir para este caminho de romper, podem contar connosco. Aqueles que acham que em 2029 é que é a altura porreira - desculpe a expressão - para o Salário Mínimo Nacional ser fixado num valor que é hoje já praticado em Espanha, não estão a ver bem”

Sem hesitações, ambos admitiram muitas “convergências” mas não fugiram às diferenças. Paulo Raimundo apontou a crítica da CDU à extinção do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF), Mariana Mortágua lamentou as posições dos comunistas sobre a eutanásia ou o aprofundamento da paridade que os levaram a ficar sentados.

“Temos convergências em temas centrais, mas se me pedissem uma diferença: custou-me quando o PCP não se levantou para votar o direito à eutanásia, da paridade entre homens e mulheres, são divergências sobre propostas que tem passado pela AR, somos partidos com histórias diferentes”, mas, acrescentou, “as propostas do BE são todas as propostas para mobilizar a esquerda para este combate, o nosso adversário é a direita não o PCP”

Imposto sobre ricos e a caixa de ferramentas

São "três as prioridades" do BE: baixar preço casas, os trabalhadores por turno e taxar os 0,5% mais ricos com "um imposto justo" - que renderia três mil milhões de euros. Paulo Raimundo sugere outra via, como o fim dos benefícios fiscais a não residentes ou das PPP rodoviárias.

“O que propomos é soluções, encontrar verbas para dar resposta à vida das pessoas. A taxação dos mais ricos é um caminho mas não precisamos de ir tão longe, no Orçamento do Estado há instrumentos para agir de outra maneira. Desde logo através dos 1.700 milhões de euros em benefícios fiscais daqueles que estão lá fora e fazem negócio com as casas cá”

Raimundo voltou a apontar o dedo à Banca, convidando os governos a terem “coragem” para agir perante o “problema gravíssimo” da habitação. Mariana Mortágua aproveitou para voltar a trazer Pedro Nuno Santos para o debate.

“Pedro Nuno Santos diz que não há mais nada a fazer, todas as medidas [na habitação] estão tomadas, isto é desistir das pessoas. (…) o teto nas rendas resulta - baixa preços já para esta geração. Mas é preciso tudo, construir, reduzir o Alojamento Local, parar a construção de hotéis em cidade sobrelotadas, reabilitar e alocar património público. (…) A construção é importante mas demora”

E Paulo Raimundo completou: “O nosso problema não é a falta de casas, o problema é a falta de casas que as pessoas conseguiam comprar ou arrendar. É preciso coragem para tomar medidas ou vamos continuar a caminhar para aumentar desigualdades. É preciso coragem para travar a especulação, travar os responsáveis - a Banca, os fundos imobiliários e os governos. A dimensão é tal que não é simples resolver de um dia para o outros, é quase preciso uma caixa de ferramentas”.

Imigração e Defesa

Sobre a imigração, Paulo Raimundo admitiu que Portugal "é um país de recursos limitados", mas questionou o que ficaria a funcionar se milhares de imigrantes se fossem embora.

A coordenadora do BE lamentou que o tema imigração tenha sido usado como "tanque de batalha ideológico" pela extrema-direita e arrastado todos os partidos, incluindo o PS, que "deixou órfã a sua política de manifestação de interesse".

Mas, e em concordância, ambos rejeitaram que seja necessário aumentar o investimento em Defesa, com Mariana Mortágua a alertar que se o país aumentar os seus gastos para 2% do PIB custará "mais de oito mil milhões de euros", o que equivaleria "a um milhão de pensões ou mais do que se gasta em todos os profissionais de saúde".

"Isto não é uma questão de defesa, é sobre a indústria de armamento", disse.

"Nós devíamos estar tão preocupados com a entrada dos russos pelo porto de Leixões, como disse a Mariana Mortágua, como com os norte-americanos pelos Açores. Só há duas opções, não há meias opções: ou nós optamos por alimentar a guerra, dar gasóleo à guerra, ou nós travamos a guerra", corroborou Raimundo.

E Montenegro?

O caso que envolve o primeiro-ministro em gestão e que hoje voltou a ser notícia, também foi tema, com Paulo Raimundo a repetir o que disse cara a cara ao próprio no primeiro debate: “A única que devia ter tido era naquela celebre comunicação ao país demitir-se, mas não fez”.

Mas vai o tema marcar a campanha? “Vai marcar sim, é inevitável porque Luís Montenegro violou as regras de exclusividade como primeiro-ministro e há questões que nunca esclareceu e que arrastaram o país para eleições. Mas quero dispensar o máximo possível esse tema porque o que importa mais são as propostas para o país”.