Os Estados Unidos reiteraram os apelos ao cessar-fogo em Gaza e à libertação de reféns, um dia depois de ser confirmada a morte do líder do Hamas, Yahya Sinwar. O secretário da Defesa dos EUA, Lloyd Austin, defende que o assassinato de Sinwar pelas forças israelitas foi um grande feito, dado o papel do islamita como arquiteto do ataque transfronteiriço do Hamas a Israel, no ano passado, que desencadeou a guerra.
A morte de Yahya Sinwar, na opinião de Austin, “remove um enorme obstáculo”, além de proporcionar "uma oportunidade extraordinária para alcançar um cessar-fogo duradouro, para pôr fim a esta guerra terrível e para apressar a ajuda humanitária a Gaza”. Lloyd Austin falava numa conferência de imprensa na sede da NATO, em Bruxelas, depois de o primeiro-ministro israelita, Benjamin Netanyahu, ter prometido continuar a lutar.
Questionado sobre as observações de Netanyahu, Austin disse: “É claro que existe uma oportunidade, e esperamos poder trabalhar juntos para aproveitar essa oportunidade. Há claramente oportunidades para uma mudança de direcção e esperamos que as partes aproveitem isso, tanto em Gaza como no Líbano.”
De acordo com a autoridade norte-americana, a prioridade é garantir a libertação dos reféns ainda detidos pelo Hamas, incluindo norte-americanos. “Passaram por um inferno, assim como as suas famílias”, lembrou Austin. “Aqueles que mantêm reféns devem libertá-los imediatamente.”
O Hamas já respondeu que os reféns só seriam libertados com o fim das hostilidades em Gaza, a retirada de Israel e a libertação dos seus prisioneiros. Por outro lado, o Governo de Israel rejeitou várias tentativas dos EUA (e não só) de mediar um cessar-fogo em Gaza e no Líbano.
Ainda na sequência da execução de Yahya Sinwar, a “CNN” avançou que o corpo do líder do Hamas poderá ser usado como “moeda de troca” para a libertação de reféns israelitas ainda retidos em Gaza. Os restos mortais do mentor intelectual dos ataques terroristas do 7 de outubro estão atualmente num local secreto em Israel, depois de ter sido morto pelas forças israelitas no sul de Gaza. Foi também confirmada esta sexta-feira a morte do segurança que velava Sinwar em Gaza, na operação de há dois dias.
Ainda que seja um “sucesso notável para Israel”, a morte de Sinwar era também “inevitável”, considera Jamie Shea, antigo vice-secretário-geral adjunto para os Desafios Emergentes de Segurança da NATO, em declarações ao Expresso. “Sinwar não conseguiu escapar de Gaza, uma geografia pequena, e os israelitas estavam a usar todos os seus recursos das secretas - fontes e contactos, testes de ADN e geolocalização - para o encontrar. Então, claramente, o círculo à sua volta estava a fechar-se.”
Mas o antigo responsável da NATO acredita que “Israel está agora numa encruzilhada”. Pode esquivar-se reclamando vitória. “A liderança do Hamas foi decapitada e os seus comandantes superiores foram mortos. Sinwar foi o instigador do ataque do 7 de outubro, pelo que Netanyahu pode agora declarar missão cumprida quando se trata de exercer vingança e parar as suas operações militares. Valerá a pena continuar as operações militares, agravando a crise humanitária e atraindo mais críticas dos EUA e internacionais, para depois matar mais alguns agentes de nível médio no Hamas?”
De acordo com Jamie Shea, existem “poucas boas oportunidades para terminar uma guerra de forma graciosa, e esta é uma que os israelitas não devem perder”, até porque continuar a lutar significará elevar o número das baixas israelitas e implicará “mais miséria humana com poucos ganhos estratégicos”. Israel pode desmobilizar-se, evitar uma guerra com o Irão e começar a recuperar a sua economia. “Continuar a tentar matar todos os combatentes do Hamas ou do Hezbollah não é um objetivo realista nem viável. Um carro sem rodas é tão inútil como um carro totalmente destruído.”
A segunda opção é continuar a guerra, para esgotar ainda mais o Hamas e o Hezbollah. Os porta-vozes israelitas sugeriram que Israel vai continuar porque ainda há comandantes do Hamas em liberdade. Mas, segundo Jamie Shea, o problema é que “Israel prolonga a guerra porque não tem ideia do que fazer com a paz”. Isto é: “Não tem qualquer plano para o futuro de Gaza e para a sua reconstrução e segurança, através de uma força internacional de manutenção da paz, ou da relação com os palestinianos. Não tem qualquer plano sobre como manter a segurança na sua fronteira norte com o Líbano e nenhum plano para a dissuasão a longo prazo do Irão.”
Já o Hezbollah e o Hamas escolherão novos líderes, mas poderão levar anos a reconstruir as suas organizações e capacidades. Tanto o Hamas como o Hezbollah estão habituados a perder regularmente os seus líderes às mãos dos israelitas. O modus operandi de ambas as milícias evoluiu ao longo dos anos para ser capaz de encontrar rapidamente substitutos e continuar a operar, mesmo com vácuos de liderança ou transições no topo. Ainda que não se deva sobrestimar o impacto dos assassinatos de Haniyeh ou de Sinwar, de acordo com Jamie Shea, há uma janela de oportunidade. É “um bom momento para Israel fazer a transição de um administrador de guerra para uma estratégia de paz”, ainda que a paz também signifique que “Netanyahu terá o seu dia de ajuste de contas com o eleitorado e a sociedade israelitas, e, muito provavelmente, perderá o poder”.
“Há poucos sinais de que Netanyahu se tenha preparado para a paz e tenha uma estratégia política a longo prazo, em oposição a uma estratégia militar a curto prazo. Como nos recorda Maquiavel, em ”O Príncipe", é muito mais fácil começar guerras do que acabar com elas."
Outras notícias a destacar:
⇒ O Exército israelita detetou cerca de 75 projécteis disparados do Líbano, enquanto o Hezbollah afirmou ter visado com mísseis e uma salva de rockets Haifa, no norte de Israel, e zonas a norte desta cidade. Em comunicado, o Exército israelita afirmou que esta manhã foram intercetadas pela força aérea duas aeronaves não tripuladas que se aproximavam do território israelita a partir do Líbano.
⇒ O Presidente turco, Recep Tayyip Erdogan, apelou às Nações Unidas para que imponham um embargo de armas a Israel, considerando-a a solução mais "eficaz" para pôr fim ao conflito na Faixa de Gaza. Num comunicado de imprensa divulgado no final de uma reunião de várias horas em Istambul com os ministros dos Negócios Estrangeiros da Rússia, Irão, Arménia e Azerbaijão, o líder turco criticou o comportamento de Telavive na crise no Médio Oriente.
⇒ O chefe do Estado-Maior das Forças de Defesa de Israel, o tenente-coronel Herzi Halevi, disse que "estimativas conservadoras" sugerem que pelo menos 1500 membros da milícia xiita Hezbollah foram mortos em ataques do Exército israelita no Líbano.