
Para quem dedicou uma vida profissional e em boa medida pessoal, ou em ambas as vertentes uma parte significativa da sua existência ao SNS, isto torna-se não só intolerável, como compreensível…
Mas não apenas pela conhecida e arrastada má gestão do SNS, ou pela falta crónica de investimento em recursos humanos, equipamentos e instalações, ou pela cretinice que leva os partidos do arco do poder em não se concentrarem em definir uma estratégia clara, séria, decidida e a 20 ou 25 anos para o SNS.
Há que entender e procurar as causas subjacentes também à prática profissional nas várias áreas e carreiras e instituições, sejam pelo lado de uma nova forma de proletariado criado pelo Estado em segmentos técnicos do SNS, sejam pelo lado de uma flagrante e dolorosa perda de humanidade que, infelizmente, está longe de ser exclusiva do SNS.
Os novos modelos de comunicação disponíveis, como nas linhas telefónicas dos serviços públicos, são exemplo disso mesmo.
As imagens que nos habituamos a ver de macas alinhadas e cheias de doentes em corredores, senão em ambulâncias que desesperam para as recuperar e regressar de volta, ou os doentes que morrem em esperas prolongadas e em abandono puro e duro, ou as greves sucessivas que deixaram de ser apanágio do sector dos transportes e das escolas, ou muitas das queixas que se repetem de alheamento de profissionais em favor da atenção dedicada aos telemóveis ou à limitação de acesso a familiares ou cuidadores são alguns dos problemas em que vale a pena reflectir.
Digo sempre que as empresas não têm alma, mas os profissionais de saúde e o SNS???
Mesmo recordando Fernando Pessoa que admiro, continuo a rejeitar o seu texto filosófico que, dizia que a humanidade sociologicamente nem perante a civilização.
Mas isso são contas de outro rosário e que não cabem aqui.
A Humanidade de que falo é a mais simples e egoísta que poderia escolher.
Isto é, que cada um avalie a situação e a pessoa ou o doente que tem pela frente e, procure agir e disponibilizar-se como gostasse de, na mesma circunstância e inversamente, ser considerado, respeitado e tratado.
Este é o grande e poderoso princípio da Humanidade que precisamos de encontrar ou reencontrar!
O primeiro passo, certamente, é desejar que cada profissional de saúde o queira ser mesmo. Seria importante e será muito difícil, mas, é indispensável que haja motivação para a actividade em saúde.
Confúcio, o grande nome da filosofia chinesa séculos antes da nossa Era, ofereceu-nos lições valiosas sobre ética, moral e organização social e dele é a máxima que afirma a educação como a arma mais poderosa para usar para mudar o mundo!
A ele recorro, em prol da Humanidade e pelos profissionais de saúde, em particular pelos médicos, no relacionamento com os seus semelhantes atingidos pela doença e marcados pelo sofrimento, qualquer que seja a forma e cores da sua modelação…
Confúcio dizia que os Homens do mesmo jeito que têm quatro membros, devem ter quatro princípios fundamentais de vida.
O “princípio da humanidade” apelando ao coração.
O “princípio da equidade e da justiça” justificando o senso crítico.
O “princípio da convivência social” impondo a educação no trato e a cortesia.
E por fim, o “princípio da sabedoria”, sabendo distinguir a verdade da falsidade e evitando a injustiça.
Apercebi-me nestes últimos tempos que o comportamento humano, tão apregoado pelas mudanças que o Mundo asseverou e propagou a respeito do que não aprendeu com a Pandemia recente, não se alterou mesmo.
Humanidade precisa-se!
O autor escreve de acordo com o A.A.O
Rui Cernadas,
Especialista em Medicina Geral e Familiar
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