Considerada uma das artistas mais importantes do continente africano, os 79 anos oferecem-lhe um olhar "sentimental" quando recorda a a resistência armada contra o colonianismo português e os anos passados na Tanzânia, durante a guerra civil.
Mas também lhe emprestam uma visão única, depois de tantas lutas e de tantas mortes, uma vez confrontada com os anos que serviriam para os atores políticos consolidarem a democracia no país, deixando apenas escapar um lamento: "Hoje, vivem de intrigas. Não é o Moçambique e a Frelimo com que sonhei", numa referência à Frente de Libertação de Moçambique, que se funde com o regime, no poder desde 1975.
A ceramista fala apenas maconde, dialeto do grupo étnico batu, que habita o sudeste da Tanzânia e o nordeste de Moçambique. A nora e o neto ajudam na tradução para o português.
"Este Moçambique, eu não gosto. Não é o Moçambique com que sonhei", reitera, dando como exemplo o terrorismo mortal que assola Cabo Delgado, onde nasceu, "as pessoas que vivem na rua e a morrer de qualquer maneira, as crianças abandonadas".
Há pouco mais de dois anos, a ceramista conhecida internacionalmente pelas formas estranhas e fantásticas das suas obras, muito ligadas à mulher e à maternidade, foi condecorada pelo Presidente português, Marcelo Rebelo de Sousa, com o grau de comendador da Ordem do Infante D. Henrique.
A distinção foi justificada pelo "génio criativo" e pela "expressão da liberdade, da afirmação da independência e da pujança e do progresso de Moçambique", com Marcelo Rebelo de Sousa a destacar que, na sua vida, "há permanentemente o criar", mas também "a realidade da luta pelo papel da mulher, o papel político e cívico da mulher, o papel da mulher como criadora cultural".
Reinata Sadimba diz que não gosta de falar muito sobre as suas obras e sobre o que estas significam: "Sou uma mulher de poucas palavras, mas converso muito com o meu trabalho. O que podia estar a falar com as pessoas, eu transformo em trabalho, converso com as minhas obras", explica.
Reinata Sadimba está presente em coleções privadas em todo o mundo e representada no Museu Nacional de Arte, em Maputo, no Museu Nacional de Etnologia, em Lisboa.
Sentada no chão, no seu pequeno ateliê, que ganhou casa no Museu de História Nacional de Maputo, as mãos continuam a moldar o barro.
Foi a forma que descobriu de poder criar para os outros, mas que também a transformaram na sua própria criatura. Apesar da felicidade de ainda poder imaginar as suas obras, Reinata Sadimba admite que ainda não realizou todos os seus sonhos. Falta-lhe, pelo menos, a tal escola, "para dar aulas aos que têm pouco e aos que mais precisam".
*** João Carreira (texto) e José Coelho (foto), da agência Lusa ***
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