Localizado na Gare Marítima de Alcântara, o novo centro interpretativo estende-se por nove salas, com informação sobre os 14 murais de Almada, concebidos para a Gare de Alcântara (oito painéis) e a vizinha Gare Rocha Conde de Óbidos (seis), e constitui-se em simultâneo como um espaço museológico da atividade portuária na década de 1940.

O centro interpretativo permite ficar a conhecer o contexto de construção e decoração dos Terminais de Navegação, a relação entre o arquiteto Pardal Monteiro, autor dos edifícios, e o artista Almada Negreiros, os estudos do artista para as Gares Marítimas e os diferentes momentos políticos e históricos que se refletiram no funcionamento das Gares, da II Guerra Mundial à emigração transatlântica, das partidas para a Guerra Colonial ao processo de descolonização.

O contexto da encomenda dos painéis a Almada e a polémica gerada à época com o resultado final, distante dos objetivos propagandísticos da ditadura, é também explicado.

Os painéis, que a História da Arte define como expressão exemplar do Modernismo, foram elaborados entre 1943 e 1949, e constituem o maior conjunto de pintura mural portuguesa do século XX. Neles está representada a Lisboa mais pobre que a ditadura do Estado Novo queria esconder.

Almada inspirou-se na realidade da capital, na partida de emigrantes, nas atividades de pesca e de construção naval junto ao rio, no quotidiano popular, em espetáculos com trapezistas e malabaristas, no bulício de peixeiras e trolhas.

A presença artística de Almada Negreiros na cidade de Lisboa, nomeadamente os espaços onde é possível encontrar outras obras do artista, assim como a sua documentação sobre as Gares Marítimas, depoimentos, entrevistas, notas, fotografias, reproduções e documentos, estão igualmente expostos.

O restauro dos painéis, que permitiu revelar as cores originais, teve início em janeiro do ano passado, inserido no projeto mais amplo de recuperação das duas gares marítimas e da criação do Centro Interpretativo, que também será dotado de um restaurante.

O Centro Interpretativo das Gares Marítimas de Lisboa resulta de uma parceria entre a Câmara Municipal de Lisboa, a Administração do Porto de Lisboa (APL) e a Associação Turismo de Lisboa (ATL), e beneficiou de um financiamento global de 8,2 milhões de euros.

Este investimento foi repartido pela ATL (3,5 milhões de euros) e a APL (quatro milhões), a que se juntaram 700 mil euros da World Monuments Fund, de apoio ao restauro dos painéis.

A coordenação de conteúdos do Centro Interpretativo esteve a cargo de Mariana Pinto dos Santos, historiadora da arte, curadora independente e investigadora do Instituto de História da Arte da Nova Faculdade de Ciências Sociais e Humanas (Nova FCSH).

Colaboraram no projeto a família de Almada Negreiros, o Centro de Estudos e Documentação Almada Negreiros -- Sarah Affonso (Nova FCSH), o Instituto de História da Arte da Nova FCSH, o Laboratório Hércules da Universidade de Évora, a Entidade Regional de Turismo da Região de Lisboa, a Fundação Calouste Gulbenkian, a RTP, o Arquivo Municipal de Lisboa e o Museu Nacional de Arte Antiga.

"É muito bom ver que o porto de Lisboa já não está de costas voltadas para a cidade", disse o ministro das Infraestruturas, Miguel Pinto Luz, no passado mês de julho, quando da apresentação pública do Centro Interpretativo. "O porto de Lisboa tem de ter uma relação simbiótica com a cidade, e os lisboetas têm de ter acesso" a este património.

"Almada [Negreiros] tem de estar representado, para dar acesso a todos os lisboetas àquilo que vai ser o novo porto de Lisboa", prosseguiu então o ministro, "um porto que não é só contentores, não é só atividade económica, mas [que está] também virado para o Rio Tejo".

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