
O sociólogo Boaventura de Sousa Santos vai desistir das ações cíveis que interpôs contra um grupo de 13 mulheres, investigadoras e antigas estudantes do Centro de Estudos Sociais (CES) da Universidade de Coimbra, optando por um processo-crime por difamação.
"Esperei, com a ação de tutela da personalidade, uma decisão rápida que permitisse, de alguma forma, limpar o meu nome. Mas percebo agora, quase um ano depois de instaurar a ação, que essas sentenças não produzirão qualquer efeito útil no meu bom nome. O mal está feito e é irreversível, e, por isso, comuniquei hoje, aos meus advogados, a minha decisão de abandonar as ações cíveis", referiu.
Três investigadoras que passaram pelo CES denunciaram situações de assédio num capítulo do livro intitulado "Má conduta sexual na Academia - Para uma Ética de Cuidado na Universidade", o que levou a que os investigadores Boaventura de Sousa Santos e Bruno Sena Martins acabassem suspensos de todos os cargos que ocupavam no CES, em abril de 2023.
O CES acabou por criar, uns meses depois, uma comissão independente para averiguar as denúncias, tendo divulgado o seu relatório quase um ano depois, em 13 de março de 2024, que confirmou a existência de padrões de conduta de abuso de poder e assédio, por parte de pessoas em posições hierarquicamente superiores, sem especificar nomes.
Uma semana depois, um grupo de 13 mulheres instou, num documento assinado por todas, as autoridades judiciárias portuguesas a investigarem com urgência as alegadas condutas criminosas mencionadas no relatório.
Numa publicação feita numa das suas páginas de internet, com data de 15 de agosto, Boaventura recordou que instaurou, em 26 de setembro de 2024, nos tribunais cíveis, uma ação especial de tutela da personalidade contra as denunciantes que residem em Portugal.
"O processo em causa tem em vista, como o nome indica, a proteção de direitos da personalidade, como é o direito ao (bom) nome, que foi premeditadamente atacado na sequência da publicação de uma carta, enviada aos órgãos de comunicação social, CES, Ministério Público e várias universidades com as quais colaborava, pelas mulheres que identifico neste texto. Ao contrário do expectável, essa ação ainda não terminou", lamentou.
Segundo o investigador, no julgamento que arrancou em novembro de 2024, ainda não foi produzida metade da prova testemunhal.
"Estranhamente, todos os depoimentos das minhas testemunhas não ficaram audíveis por um alegado problema na gravação (que não existiu quando foram ouvidas as assinantes da carta), estando o Tribunal há vários meses a tentar recuperar as gravações. Caso não o consiga, terão de ser repetidos os depoimentos", indicou.
Numa fase inicial do processo, Boaventura de Sousa Santos tentou que o Tribunal impedisse que as quatro rés fizessem declarações contra si, até que fosse proferida a decisão final.
"Em vão. Nessa sequência, as quatro rés, bem como algumas das estrangeiras contra as quais também instaurei um processo de tutela da personalidade (que deu entrada mais tarde) deram uma entrevista ao canal 'Now', acusando-me de vários tipos de assédio", acrescentou.
Apesar de desistir das ações cíveis, o investigador diz que não pode deixar impunes os que "causaram este mal".
"Não sendo possível a tutela do meu nome, não me resta alternativa que não seja a punitiva. Por isso, informo que, ao contrário do que era minha vontade há um ano, instaurei um processo criminal contra todas as assinantes da carta", alegou.
Na publicação, informou ainda que três dessas mulheres decidiram também agir criminalmente contra si, depois de ter apresentado a sua queixa.
"Estou plenamente convicto que o fizeram para tentar pressionar-me a desistir da queixa que apresentei contra elas ou para tentar tirar força à minha queixa: uma comum tática processual habitual dos que não têm a razão do seu lado. Estou convicto disto, porque não me acusam de assédio (como fizeram publicamente), mas de difamação", concluiu.