A dor ainda está viva para este colombiano entrevistado pela AFP a 14 de setembro, quando emergiu do Ground Zero às duas da manhã sob uma salva de palmas após passar mais de 40 horas a procurar sobreviventes, e depois por videoconferência quase 20 anos depois em sua casa, em Bogotá, onde ainda se questiona se poderia ter feito mais para ajudar.

"Fico arrepiado. Sabíamos que havia muita gente presa ali", diz, emocionado, Marulanda, hoje com 57 anos, ao lembrar aquela noite, quando os desaparecidos eram contados aos milhares.

Quando os extremistas islâmicos sequestraram e lançaram os dois aviões comerciais contra as Torres Gémeas, Marulanda estava em Nova Iorque por acaso para fazer um curso de instrutor de bombeiro e comprar ambulâncias para a Cruz Vermelha colombiana.

Chegou ao sul de Manhattan para se oferecer como bombeiro voluntário pouco após as nove da manhã de 11 de setembro, antes do colapso brutal das torres. Só sairia dali 90 dias depois.

Sem vestígios

Carregando 45 kg de equipamento - cilindro de ar comprimido, facão, pedaços de mangueira, bocais - foi um dos primeiros que tentou entrar na torre norte para tentar evacuar pessoas enquanto as primeiras unidades dos bombeiros chegavam.

"Chegámos a subir cinco degraus, nada mais. O caos era enorme, as pessoas atiravam-se uma sobre as outras. Era impossível subir, havia um turbilhão humano", lembra Marulanda, que tem grande experiência como socorrista em terremotos, avalanches e outras catástrofes na Colômbia, Equador, Peru, México, Haiti e Nova Zelândia, além do 11/9.

"Graças a Deus não nos deixaram subir porque teríamos morrido no colapso", assim como muitos bombeiros que chegaram pouco depois, assegura.

Permaneceu no Ground Zero durante três meses, primeiro à procura de sobreviventes, dormindo poucas horas ao lado de outros socorristas em escritórios próximos desertos, e depois recolhendo provas de todo tipo. Encontrou desde restos humanos ao trem de aterragem e caixa preta de um dos aviões sequestrados.

"Vi membros soltos, troncos soltos (...) Vi muitos, muito corpos carbonizados que ficaram muito pequenos, reduzidos, impossíveis de identificar", no meio de um forte cheiro "a carne assada" e estruturas colapsadas, contou este especialista sobre aquela noite em que trabalhou, exausto e coberto de pó e suor, sob os enormes holofotes que iluminavam o Ground Zero coberto de fumo.

Esta é uma das coisas que ainda o perturbavam: o impacto do colapso das torres foi tão grande que nunca foram encontrados os restos - nem mesmo vestígios de DNA - de centenas de vítimas. Muitas famílias nunca puderam sepultar os seus mortos.

"Vi uma família mexicana, à qual entregaram um par de sapatos para enterrar, lembro das caras deles, o tradutor falava e a mulher dizia: 'E você quer que eu leve isso comigo?'".

"Encontrei dedos e um tufo de cabelos compridos, acho eu que de uma mulher. Daí tiravam o DNA. Camisas, um braço, uma mão esmagada...", lembra.

Das Torres Gémeas, o que mais o chocou foi "a destruição gigante, muito, muito gigante, num espaço muito reduzido". E a lembrança de muitos imigrantes em situação ilegal que não ousavam sequer pedir informação sobre os seus familiares desaparecidos com medo de serem deportados.

"Poderia ter feito mais? Fiz o suficiente?"

Luis Eduardo Marulanda também auxiliou vários bombeiros presos no desabamento do edifício 7 do WTC, de 47 andares, que colapsou sete horas depois das Torres Gémeas. "Corri para ajudá-los, lavei os seus olhos, dei-lhes oxigénio, injetei líquidos intravenosos", contou 20 anos depois.

Hoje, ainda se pergunta "se aqueles que morreram tinham que morrer". "Poderia ter feito mais? Fiz o suficiente?", pergunta-se. Sentia "uma dor de pátria, embora não fosse a minha pátria. Mas não precisamos ser cidadãos americanos para sentir essa dor. E isso persiste", reflete.

Foram "dias maratónicos" e quando não aguentava mais, pedia ajuda aos psicólogos instalados em barracas montadas do outro lado do rio Hudson, em Nova Jersey. Ali também havia quiropráticos "que nos desmontavam, mas deixavam-nos como novos".

Marulanda reviveu durante meses a tragédia do 11/9 nos seus sonhos. "A minha esposa dizia-me que eu saltava muito na cama, dizia-me que isso a incomodava e a acordava a qualquer hora. Precisei começar a procurar ajuda psicológica profissional, falar muito do tema".

Não houve tempo de pedir a extensão do seu visto americano naqueles três meses em que trabalhou no Ground Zero. Quando quis voltar à Colômbia, levaram-no a um juiz migratório."Queria que fosse deportado, dizia que eu era um irresponsável, um abusado. Fui proibido de voltar aos Estados Unidos durante sete anos".