
Quando a Iniciativa Liberal apareceu no panorama político português, muita gente — incluindo eu — viu nela uma lufada de ar fresco. Um partido novo, com discurso liberal na economia, progressista nos costumes e com a promessa de modernizar a política portuguesa, secando o populismo à esquerda e à direita. Mas o que vimos nos últimos anos foi uma triste caricatura dessa promessa.
A IL transformou-se numa força política obcecada com soundbites para redes sociais, com deputados e assessores mais preocupados em fazer figuras para os cortes de 30 segundos do que em construir soluções consistentes para o país. A ambição reformista ficou enterrada debaixo de discursos de pub de final de noite e de provocações infantis no Parlamento.
O momento em que Bernardo Blanco, no Parlamento, usou a frase “o mercado resolve” para justificar a ausência de soluções para a crise da habitação tornou-se viral — não pela inteligência, mas pela absoluta vacuidade política. E a isto somam-se episódios protagonizados por Mariana Leitão, que se tem destacado mais pela agressividade gratuita e pelo espetáculo do que pelo conteúdo. Desde as constantes intervenções em tom de provocação, sem proposta de fundo, até ao recente momento em que, perante a contestação de professores no plenário, respondeu com um sorriso arrogante e desprezo institucional, Mariana Leitão tornou-se o rosto do estilo tóxico que a IL quis normalizar na Assembleia.
A IL deixou-se capturar por uma visão economicista simplista, onde tudo se resolve com privatizações, cortes e desregulação, como se estivéssemos na década de 80 a reler manuais de Milton Friedman. Perante temas estruturais — como a habitação, o SNS, a precariedade ou a crise ambiental — a resposta da IL resume-se a chavões estafados e a um desprezo arrogante pela realidade social do país.
No plano político, a IL também falhou. Incapaz de se afirmar como alternativa séria, optou por um estilo de guerrilha verbal, mais preocupada competir, na mesma moeda, com o Chega do que em apresentar propostas viáveis. Ao fazê-lo, normalizou a política de espetáculo e perdeu o crédito junto de setores moderados e liberais que a apoiaram em 2019. A prova está nos resultados das últimas legislativas: estagnou e recuou onde devia ter crescido, tendo Rui Rocha demorado duas semanas e um recado de João Cotrim de Figueiredo para abdicar da liderança.
E o sinal mais claro deste declínio é o próprio desinteresse dos seus militantes e simpatizantes. A próxima Convenção Nacional conta apenas com cerca de 950 inscritos, muito aquém dos números registados nas convenções anteriores, que sempre ultrapassaram os 1.500 participantes. Um partido que se dizia em crescimento não consegue hoje mobilizar sequer mil pessoas para a sua reunião máxima. É a confirmação prática de que o entusiasmo evaporou e que a IL perdeu o país antes sequer de ter chegado a governá-lo.
A incoerência ideológica também foi evidente. Um partido que se diz liberal e meritocrático mas que votou contra aumentos salariais sem apresentar qualquer plano alternativo para melhorar o poder de compra, que proclama defender a mobilidade social mas rejeita qualquer avanço real na conciliação entre trabalho e vida familiar, tendo votado contra propostas para reforçar as licenças parentais, sem apresentar soluções liberais credíveis para proteger famílias e crianças, e que se autoproclama defensor das liberdades individuais mas hesita sempre que a agenda progressista social interfere com o eleitorado conservador urbano, é um projeto que perdeu o norte.
A IL tinha tudo para ser uma força política relevante em Portugal. Mas preferiu tornar-se num meme ambulante, mais preocupada em viralizar do que em governar. Se não corrigir o rumo e não abandonar este oportunismo arrogante travestido de liberalismo, arrisca-se a ser apenas mais uma nota de rodapé na política nacional. E o país, que precisava desesperadamente de um liberalismo sério, rigoroso e socialmente responsável, ficará a perder.